Esgueira - Aveiro
Fotografia: Carlos Pádua
Texto: Jorge Cunha
Vai o caminhante no seu caminho e na sua vida e, como é de regra em quem assim vai, não reparam os seus olhos nas coisas por que passa. Vai metido com os seus pensamentos, a falar com os seus botões, a evocar no seu íntimo algum gosto, ou a remoer com azedume, ou mágoa, ou revolta, algum desgosto, ou simplesmente a pensar em nada, o que também acontece, ainda que isto seja só uma maneira de dizer, porque sempre o pensamento está a pensar em alguma coisa, mesmo que essa alguma coisa não seja mais que um discorrer sem rumo certo, folha levada pelo vento. Podem também os olhos do caminhante estar velados pela névoa da rotina de quem já muitas vezes passou pelo mesmo sítio, sabendo-se como é a habituação uma particular forma de cegueira.
Mas não somos agora esse caminhante. Reparemos, por isso, nesta paisagem, que bem o merece. Deixemos os olhos ir do perto para o longe, ou ao contrário, dos contornos difusos que a distância dá às coisas para a nitidez do que está perto; não deixemos passar despercebida a harmonia do todo, feita da aparente desordem das suas partes; nem este caminho que vai ao longo do campo entre luz e sombra; nem estas árvores que aqui, na beira do caminho, têm as suas raízes, e a sua sombra, e o Outono anunciado.
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