Fontão - Albergaria-a-Velha
Fotografia: Carlos Pádua
Texto: Jorge Cunha
Do moinho até casa é sempre a subir, não admira pois que moleiro e azêmola chegassem enfadados. Por isso a carroça ali ficou, no aido, com os varais no chão, a descarga dos sacos ficará para depois. A besta, aliviada do jugo, estará a retouçar à beira do caminho, ou no curral, e o moleiro terá procurado o frescor da casa, a bênção de uma tarraçada de água, o alívio de um banco.
Nas costas de quem olha para a carroça está uma padaria. Pensará quem não conhece o sítio onde agora estamos que será modesta a padaria, por certo, e nisso não erra. Estômagos e sensibilidades mais delicados poderão mesmo ser tomados por alguns engulhos, mas quem esperaria encontrar aqui um lugar asséptico? O forno é aquecido a lenha, vêem-se por ali restos de ramaria seca de eucalipto, as paredes escurecidas pelo fumo não enganam, tão pouco os tectos fuliginosos. São braços que amassam o pão, em velhas masseiras de madeira gastas pelo uso e pelo tempo que tudo come, aí leveda a massa o quanto baste, tudo são gestos sábios e antigos, vêm do fundo do tempo estes saberes. Entra depois o pão no ventre do forno, o calor fará o que falta fazer, é pouco e é muito, não tarda que o milagre do pão se conclua, o ar rescendente irá anunciá-lo em breve.
Então, só então, será oferecida aos olhos deslumbrados a figuração da abundância, o pão para todos.
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